quinta-feira, 12 de julho de 2007

Milhares de Redes por todas as partes - Parte 2/6


Euclides André Mance
Março de 2007

Integrando quem estava isolado ou desarticulado, surgem redes colaborativas e solidárias por toda a parte. Seus acúmulos vão sendo sistematizados em cartas de princípios. Suas elaborações dão origem a plataformas propositivas. Criam-se novas formas organizativas para facilitar a comunicação, a produção coletiva do conhecimento, as tomadas de decisão e as ações coordenadas, interligando os diversos atores que as compõem. Simultaneamente ações diversas se realimentam de maneira centralizada, descentralizada e distribuída. Processos totalmente descentralizados, por exemplo, ganham força pela intervenção distribuída de cada participante, agindo com autonomia, tendo por referência a carta de princípios e a plataforma da rede. E todos os atores distribuidamente se entre-apóiam, reforçando e realimentando suas ações em processos comunicativos e de tomadas de decisão coletiva – seja, por exemplo, em um sistema eletrônico de comunicação e votação, centralizado um mesmo fórum na Internet, seja pela participação presencial em algum fórum ou assembléia.

Os Fóruns Sociais Mundiais são a ponta de um gigantesco iceberg.
Eles não existiriam ou não teriam a capilaridade que têm se não houvesse as redes (conectando o local e o global) e seus fluxos comunicativos e tomadas de decisão, mediados por diferentes tecnologias, especialmente as novas tecnologias da informação. As primeiras expressões recentes de processos desse tipo remontam às manifestações de Seattle, durante os protestos contra a OMC, em 1999.

Mas o limite dos FSM é que eles avançaram muito pouco para a construção de Redes Sociais Mundiais. São um momento importante de conexão de milhares de atores. Durante essa conexão há um significativo fluxo de comunicação das diversidades inerentes a essas redes. Mas passado o evento, os fluxos de comunicação entre as organizações caem a níveis mínimos e as ações retornam basicamente aos patamares preexistentes, acrescidos, todavia, do importante acúmulo produzido coletivamente. Em geral, alguns atores que se conhecem nos FSMs acabam por manter suas conexões, fortalecem seus intercâmbios e passam a fazer algumas coisas juntos. Mas tudo isso, embora seja muito importante e necessário para o avanço das lutas, ainda é pouco frente ao que se poderia fazer se os FSMs objetivassem a tecitura e fortalecimento de redes mundiais colaborativas.

Se de fato assumirmos como horizonte a construção de redes sociais mundiais, a construção de redes solidárias colaborativas em escala global, devemos buscar formas de promover, fortalecer a ampliar a base integrada na defesa de todas as proposições de todas as redes e cada qual deve fortalecer as demais. Porém, mais do que simplesmente difundir suas propostas, atuar no plano do debate das idéias, no plano da transformação da cultura, cabe simultaneamente atuar nos planos econômico e político. Não apenas na defesa política das proposições construídas democraticamente pelas organizações solidárias em redes colaborativas, não apenas na luta pela substituição de governos em favor da realização dos objetivos populares inscritos nas plataformas construídas democraticamente.
Mas, especialmente, na vivência econômica daquilo que propõem as redes colaborativas na esfera da economia solidária. Isso é, contribuir pela nossa ação econômica cotidiana na transformação das estruturas econômicas globais. Pois de nada adianta difundir idéias de transformação do mundo para a construção de um mundo melhor ou lutar politicamente em favor dessas mesmas idéias, se, com nossas próprias práticas econômicas, nós mesmos combatemos o que propomos e fortalecemos as grandes corporações e os setores economicamente dominantes que renegam nossos objetivos e valores solidários.

A grande lição aprendida é unir o local e o global. Precisamos defender as economias soberanas não apenas nos debates que fazemos nos FSMs ou nas manifestações contra a OMC, mas igualmente quando escolhemos os produtos que vamos consumir quotidianamente, decidindo eticamente o que fazemos do nosso dinheiro e quais segmentos econômicos vamos fortalecer com ele. Precisamos defender o equilíbrio dos ecossistemas não apenas em nossos discursos e manifestações, mas selecionando os produtos e serviços que consumimos ou usufruímos, visando reduzir os impactos ambientais desse consumo. A grande lição é que não basta combater o bom combate no plano da cultura ou da política, é preciso estendê-lo ao plano da economia. É preciso participar economicamente da Revolução das Redes. Na minha opinião, há uma revolução das redes em curso e estar vencendo – lembrando do slogan escrito em um muro de Seattle durante os protestos contra a OMC em 1999 – significa expandir e fortalecer os processos colaborativos e solidários dessa revolução que está na
base da possível emergência de sociedades pós-capitalistas.

Por Euclides André Mance - Março de 2007
(Tradução sintética ao Inglês em http://www.turbulence.org.uk/solidarityeconom.html )

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